quarta-feira, 19 de agosto de 2009

“Pra que serve a gente ser feliz?” (Macabéa, A Hora da Estrela, Clarice)
"Felicidade pra quê?" (Abujamra parafraseando Clarice)

Delícia, Abú! Menos palatável porque "outra sintaxe"; mais semântico porque menos palatável! E assim vamos aproveitando as aulas de Teoria da Literatura...

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Foi uma bala pra cada uma.
A casa é grande. São três pessoas pra cuidar dela. Eu, hoje, tive de ficar sozinha na "sala principal". Eu, O Lustre (não o da sala, o da Clarice mesmo, em formato e-book), o MSN, o orkut e meu blog.
Não sei, não sei... O que eu faço com isso tudo?
A sensação é, afinal, boa. Casa e escritório ao mesmo tempo - o que é diferente de escritório e casa ao mesmo tempo. Um café na cozinha, uma conversa; um cigarro lá fora, mais um café. E a vontade de levar uma bala com papel rosa-choque pra cada uma.
É esse aconchego que me faz lembrar que o universo dá conta de tudo. Escolhi ter um emprego, mas hoje tenho bem mais que isso.
Tem sido um bom momento este que estou a viver. Iniciei uma fase em que me pretendo funcionar, acima de qualquer coisa, como uma peça do quebra-cabeças que o cosmos joga, e estou pagando pra ver no que dá.
Porque a questão surge assim: deu errado porque eu não percebi a tempo que sou mais PEÇA do que JOGADOR?
E eu só vou saber mesmo se conseguir usar aquela coragem... Sim, aquela mesma coragem que antes me impelia ao controle. Dessa vez, vou ver se consigo usá-la para me entregar ao universo. Por que não? Por que não viver o solto? O leve? O indeterminado? O sabe-se-lá-o-que-pode-acontecer?
Esse espaço é uma benção pra mim. Me devolve uma segurança que eu perdi. Uma sensação de acolhimento que não consigo atingir sequer na casa da minha mãe, onde passei a viver. E é muito por conta disso, dessa vontade de estender a mão e entregar uma bala pra cada uma delas.
O meu dentro é também isso: dividir, compartilhar, pertencer. Respeitar, cuidar e amar. E, sobretudo... escrever sobre isso.
Vou precisar de várias postagens para dar conta desse "sobretudo". Eu não quero que ele me atrapalhe mais.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Literatura é forma e conteúdo ao mesmo tempo, é evidente! Mas uma reflexão breve em cima disso nos leva a enxergar que o conteúdo, antecedendo a forma, é, digamos, a matéria prima do fazer literário. Hoje, por exemplo, eu já não deixaria mais de mostrar as pequenas coisas que viesse a escrever por medo de não poder encaixá-las em uma estética. Penso que meus escritos são, antes de mais nada, o meu poder de sentir e observar as coisas. Certamente que minhas escolhas em termos de procedimento estético podem me aproximar mais de uma escola do que de outra, e tals, mas, antes de mais nada, o que grita é a necessidade de dizer, e não a maneira como deve ser dito. As duas coisas se encaixam só depois, aos poucos. Nessa medida, o fazer literário em sua plenitude se caracteriza sempre depois. Não que a forma cumpra papel secundário, mas aparece, de fato, apenas num segundo momento, seja na história ou no processo criativo de cada escritor.

Pra comu TEORIA DA LITERATURA, Tópico: Forma ou Conteúdo? (Forma: porque depois de Homero tudo já foi dito OU Conteúdo: porque escrevo pra registrar o que eu sinto)

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

E então eu resolvi falar de... Amor. Amor, literatura e alguma coisa mais ao mesmo tempo.
Acho que literatura antes mesmo de amor, viu? Estou num momento da minha vida em que finalizar é palavra de ordem. Mesmo que tenha que recomeçar depois; mesmo que a impressão seja a de que aquilo não tem término. A gente sempre consegue fechar um ciclo - eu juro!
E antes que eu me perca, lá em cima eu estava relacionando LITERATURA com finalização. Pois é. Vou tentar começar do começo.
Na madrugada de quarta-feira passada, 3 Heinekens foram suficientes pra eu fechar a minha boca com medo de dizer merda, ou melhor, medo de dizer muito pouco perto do que eu poderia se estivesse sóbria. A questão foi colocada, mais resumidamente, assim: Cazuza foi um poeta?
A pergunta fica aí, e depois eu volto nela. Sim, assim. Mas dizer que a Fernanda e a Evelyn eram os seres sensíveis envolvidos e envoltos no e pelo assunto não faz mal dizer aqui. Acontece que pausa é um negócio que rola nos momentos em que me lanço no papel e caneta ou tela e teclado, por isso pulo - preciso.
Escrever para alguém além de mim ainda é muito novo. E trabalhoso, porque você não consegue se preocupar só com o comprometimento com o "tema", com as ideias que vão surgindo, com a melhor maneira de concatená-las. Você precisa registrar os momentos desse processo: "Olha, que barato! A segunda estrutura lá em cima teve de ser modificada por que eu percebi, mais embaixo, que não conseguiria falar só daquilo que achava que fosse falar... Será que isso faz parte do processo criativo? Chegar junto para falar de uma coisa e acabar falando de outra?" E etc etc.
Gente, é uma confusão louca. Cabeça de escritor é um problema.
Ah, eu preciso esclarecer! Resolvi me intitular escritora agora, agorinha. Porque, não! Eu não consigo ter pretensões ainda! Se sucedeu mesmo é que uma fala do Roberto Juliano me veio à cabeça, me fazendo "aceitar a situação". Na sala 7, acredito que em meados de novembro de 2005, ele disse algo do tipo: "Veja, o negócio não é tão grande quanto vocês pensam! Se surge a necessidade e você se pega escrevendo diversas vezes em pequenos papéis durante o dia, então você é um escritor. Agora, se suas obras são de qualidade, aí já são outros quinhentos!" haushhaushuahsuahus
Aquele cara, que é chamado de mestre e bruxo também pelo suposto "contato" que teve com Clarice Lispector, estava falando de algo que eu fazia durante o expediente, e que sentia como sendo muito estranho à realidade das pessoas a minha volta. Na época trabalhava numa livraria. Entre um cliente e outro, uma ideia, um papelzinho. Devo ter alguns ainda.
Mas, voltando (mais uma vez, antes de me perder de novo), o assunto é Cazuza X Poesia, certo?
Sabe, me encanta a literatura de verdade; a arte, o labor da palavra. É preciso muita sensibilidade pra mexer com palavras. Cada uma no seu lugar certo. Cada uma pedindo pra ser usada porque só ela caberia naquele momento, só ela poderia se comunicar bem com as que estão ao seu redor.
Porque comunicar é sempre mais possível de acontecer do que comunicar com toda a "força" que se pode num determinado momento, sobre determinada coisa ou sentimento, entende? E acho que foi exatamente isso que a Valéria quis dizer naquela provavelmente primeira aula na Sala 11, em março de 2004.
Assim, pra pensar sobre questões dessa ordem, não tem jeito, se faz necessária certa bagagem. Acho um pouco difícil um engenheiro químico levantar algo sobre que mereça crédito. Mas, tipo, eu estou aqui me borrando de medo, porque tô tropeçando no segundo semestre de Letras, e minha insegurança grita aqui dentro dizendo que é pouco, é pouco pra falar... MAS EU QUERO COMEÇAAAAAAR! (...) Obrigada.
Bom, Todo Amor Que Houver Nessa Vida... Adoro! O Cazuza constrói imagens de muita beleza: Eu quero a sorte de um amor tranquilo/ Com sabor de fruta mordida/ Nós na batida, no embalo da rede/ Matando a sede na saliva

Putz... Bonito pra caralho, meu. Comunica pra caralho! Mas será que se compara a:
Que roupa você veste? / Que anéis? / Por quem você se troca? / Que bicho feroz são seus cabelos, que, à noite, você solta?

Gente... Tudo é vermelhinho mesmo. O cara constrói imagens muito fortes! Eu sinto, quando leio isso - e mais ainda quando ouço, na voz dele - que as palavras, graças a essa ordem que ele estabelece pra elas, foram tão potencializadas, mas tão potencializadas, que qualquer coisa que alguém tentasse escrever pra tentar dizer o que ele diz, para comunicar o que ele comunica, seria em vão.
Ah, detalhe. A obra em questão é do Chico Buarque, compositor da nossa MPB.
Sim. Mas e agora? A minha intenção é, desde o começo (e apesar de eu provavelmente não ter conseguido expressá-la) mostrar que Cazuza é compositor, e não poeta, tendo em vista o que ouvi da Valéria naquela aula. Mas e o Chico? É o quê?
Vejam que eu, neste momento, me embaralho (...)

Só me resta apelar (...)

Bom, o que se segue agora é um pouco a percepção de alguns bons nomes da literatura e música brasileiras. Aproveitem, é de uma confusão deliciosa!
Ainda bem que eu comecei este escrito. Ainda bem que eu cheguei nesse impasse. É muito bom saber que tem gente grande debatendo um troço que chegou chegando, e me inquietando, e que eu, sabe, achei que fosse tosco de soltar.

Ah! Não vai dar pra falar de amor dessa vez. Nem de outras coisas mais. Eu já finalizei bastante por hoje. Amém!


Poetas e compositores expõem as diferenças entre o poema e a canção


Fronteira pouco nítida

O que o Chico Buarque diz não importa, ele é poeta sim. Muitas das letras dele têm qualidade superior a grande parte do que se encontra na literatura. Esta semana eu peguei um texto de Chico intitulado Canção que existe, que me lembrou muito Dante em A Divina Comédia. E se você ler este texto, classifica-o como poesia tranqüilamente.A língua portuguesa tem tradição na fusão entre a poesia e a letra de uma música. Existem sutis diferenças entre as duas, claro, mas elas estão muito próximas. Não há uma regra definida para o que pode ou não ser poesia. Eu não aceito quando alguns professores de Português , estrategicamente, tentam fazer uma separação entre as duas áreas. A única coisa que eles conseguem dizer é que poesia é aquele texto que se sustenta na página. Para mim, este argumento não faz o menor sentido. Lógico que existem pontos característicos de cada um destes mistérios. Um pernambucano, João Cabral de Melo Neto, disse em Duas Águas que existem poesias para serem ditas em voz alta e em voz baixa. Ou seja, há diferenças entre música e poesia, mas a fronteira entre elas não é tão nítida. Quando eu faço um texto sabendo que este vai ser musicado, o processo de criação não é o mesmo. Por exemplo, Maria Betânia me pede uma letra, eu penso já na voz dela. Porém, ao mesmo tempo, eu posso fazer uma letra nem pensando em musicá-la e acaba acontecendo, como Mel, que só depois de pronta, foi trabalhada por Caetano Veloso. A poesia já tem um ritmo próprio. A história dos poemas prova isto, quando estes eram recitados por menestréis ou em jograis pelos povos mouros. Até hoje, percebendo o texto de Garcia Lorca, esta influência do canto popular está bem clara. Então, como a poesia tem um ritmo próprio, não há rigidez no que pode ou não ser musicado.

Wally Salomão é poeta e letrista


Canções que resistem

Em alguns casos, eu concordo que uma letra de música pode ser considerada poesia, como no Concretismo, por exemplo. Existem letras que sobrevivem independente de serem enquadradas como música. Águas de Março de Tom Jobim é para mim um grande poema. Outros artistas fazem trabalhos além da música também, como Gilberto Gil, Caetano Veloso e Chico Buarque.Eu já vi algumas entrevistas com Chico na qual ele afirma não ser poeta e acho que em certo ponto tem até razão. Eu acho interessante quando ele diz que faz primeiro a música e depois a letra. Em todo caso, Chico Buarque deve ser considerado principalmente e essencialmente músico, mas algumas de suas letras podem facilmente ser classificadas poesias, como Carolina e A banda. Estas canções resistem no papel independentemente de serem cantadas ou não.

Jacy Bezerra é poeta


Forte parentesco

Para mim, música e poesias são primas, parentes próximas. Têm uma relação forte, mas não são a mesma coisa. Às vezes, coincide de uma boa canção ter uma letra poética, mas não é sempre. Na música, antes de tudo, a letra deve ter ritmo. Por exemplo, o poema Tabacaria de Fernando Pessoa é genial, mas não para ser musicado, porque não tem ritmo. Por isso que é complicado dar melodia a um poema. Eu já fiz isto com Maracatu, que tem letra de Ascenso Ferreira e um poema de Maiakoviski adaptado por Augusto de Campos. Estes dois trabalhos tinham ritmo e se encaixavam em uma melodia.Considero, sim, que algumas letras minhas têm características de poesia. Por exemplo, Sino de Ouro que começa com estes versos: “ Hoje eu queria fazer um poema / com penas dos versos de chumbo que faço / e faria um poema voando tão leve / Um poema de éter, poema de pássaro”. Há músicas que resistem ao tempo, como Recomeçando das cinzas, Cambalhotas, Lava mágoas ou Gato da noite, que eu provavelmente fiz como um bate-bola com Carlos Drummond de Andrade. São canções cujas letras sobrevivem independentemente da música. Isto é bastante difícil hoje em dia na música popular. Muitas vezes, a melodia é belíssima, mas se você for parar para pensar, a letra é medíocre e não resiste fora da música. Eu, por ter tido esta formação literária e como comecei a escrever antes mesmo de compor, consigo na maioria das minhas letras alcançar um texto poético. Mas, às vezes, isto não acontece. Quando uma música minha não resiste ao tempo, eu sei porque.

Alceu Valença é cantor e compositor


Duas coisas diferentes

A letra de uma música é uma coisa bastante diferente de um poema. Em princípio uma letra deve ser submetida à música. Quando uma letra supera uma canção, não há uma boa canção. Quando um ouvinte escuta uma música prestando atenção primeiramente à sua letra, não é um bom ouvinte. Uma canção deve ser lembrada inicialmente por sua melodia. A poesia e a música têm relação por suas origens. Elas nasceram juntas e é por isso que a poesia tem um certo ritmo. É o que Ezra Pound chama de “melopéia do poema”. Porém, depois a música e a poesia se separaram e tomaram rumos diferentes. Eu penso como Thomas Mann escreveu no romance “Doutor Fausto”: “Um poema não deve ser bom demais para servir de material para uma boa canção. A música se sai muito melhor na tarefa de dourar a mediocridade”. Ou seja, ele diz que uma canção pode ter uma letra pobre e, mesmo assim, ser uma bela canção. Por outro lado, eu admito que excepcionalmente alguns artistas conseguem se superar e fazer letras poéticas independente da música. Chico Buarque, por exemplo, em Brejo da Cruz. Essa letra pode ser lida no papel como um poema. Caetano Veloso também atinge isso quando faz letras experimentais. E isto é perigoso para o artista. Quando se faz letras como essas, a música não funciona e não pega.

Sebastião Vila Nova é sociólogo e músico.

http://www.continenteonline.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=328&Itemid=93

terça-feira, 4 de agosto de 2009

É uma pena não poder bater no peito pra dizer que um dia respirei o mesmo ar que você respirou. Oitenta e cinco menos setenta e sete: oito anos.
(...)Mas há que me bastar o orgulho de ser brasileira ao lembrar que essa alma, gestada na Ucrânia, só tomou corpo de fato aqui. Esta terra concebeu isso que é Clarice. Foi gene, útero e parto também, não há dúvida, bem como o tempo-espaço em que tudo isso aconteceu. Mas "desabrochar" pede o fora, necessariamente. "Desabrochar"é ação que se dá de dentro pra fora, devo lembrar. No entanto, o dentro não pode ser só dentro sem o fora - sobretudo depois que inventaram a linguagem...De maneira que esse fora chamado Brasil determina o dentro de Clarice como o conhecemos.
O conhecemos?
Trecho da última entrevista concedida (TV Cultura, 1977)

J.L. Você se considera uma escritora popular?
C.L. Não.

J.L. Por qual razão?
C.L. Bom, me chamam até de hermética. Como é que posso ser popular sendo hermética?

J.L. E como você vê essa observação que nós colocamos entre aspas: hermética?
C.L. Eu me compreendo. De modo que eu não sou hermética, pra mim... Bom, tem um conto meu que eu não compreendo muito muito bem.

J.L. Que conto?
C.L. O ovo e a galinha.

J.L. Entre os seus diversos trabalhos, sempre existe - e isso é natural - o filho predileto. Qual aquele que você vê com mais carinho até hoje?
C.L. O ovo e a galinha, que é um mistério pra mim. (...)